Na segunda semana de Abril comemoram-se os trinta e cinco anos de existência do GREF – Grupo de Responsáveis de Formação das Entidades Financeiras, grupo autónomo da AEDIPE – Associação Espanhola dos Directores de Pessoal.
Paco Segrelles, Presidente e membro fundador, organizou umas jornadas inesquecíveis – no mesmo local onde o grupo havia sido fundado – e onde estiveram presentes todos os fundadores sobrevivos.
Devido à notoriedade alcançada pelo GREF estiveram também presentes diversas entidades que se fizeram representar ao mais alto nível: o Banco de Espanha, Banco Santander Central Hispano, o BBVA, práticamente todas as Cajas, Escolas de Negócios (ESADE e Nebrija), Un iversidade Complutense e outras, muitas outras entidades de grande destaque na vida espanhola.
Todos quiseram estar presentes, dar um abraço fraterno de reconhecimento ao Paco e rever aqueles que só nestas ocasiões recordamos.
Portugal esteve representado pelo Luis Vilhena da Cunha, director-geral do Instituto de Formação Bancária. A título pessoal, o escriba desta crónica também esteve presente a convite do Presidente devido ao facto de, amiúde, ser orador e conferencistas nas jornadas anuais. Foi muito bom rever amigos e colegas que não via à alguns anos e redescobrir esse verdadeiro sentido humano da ibéria.
Foram dois dias inesquecíveis – pela carga afectiva e simbólica – mas também devido ao conteúdo de duas ou três intervenções.
Realço em particular uma notável oratória de Dom Garrigues – sim, o pai do grande escritório de advogados Garrigues e grande amigo de Portugal – que, analisou a situação política e económica espanhola com grande sageza e profundidade – e sempre com uma nota de humor.
Fez também uma análise comparativa entre a economia ibérica e a economia europeia, navegou um pouco pelos grandes blocos económicos e depois centrou-se numa das questões mais importantes do mundo contemporâneo: a questão ética.
Disse Garrigues, que ainda hoje não entende o facto de a Europa se manter no domínio da ética valorativa – meros enunciados baseados no dever ser – ao contrário dos países de influência anglo-saxónica que centram toda a sua filosofia na chamada ética normativa, ou seja, na codificação das práticas éticas.
É por isso que vemos na europa uma proliferação de documentos chamados Códigos de Ética que mais não são do que meras cartas de intenções – algumas parecem copiadas dos dez mandamentos - pois não contêm qualquer codificação dos dilemas éticos e da forma de os resolver.
E porque não codificamos os dilemas éticas, continuamos a não encontrar respostas adequadas para todas aquelas situações quotidianas onde se colocam problemas relacionados com o “certo e o errado” e o “bem e o mal”.
A europa continua refém ainda de um mundo de intenções (e lá diz o ditado popular que o inferno está cheio delas), atrasando-se no controlo de práticas que geram fenómenos de graves consequências sociais e económicas como o fenómeno da corrupção, que, gostemos ou não de o admitir, atravessa linearmente as sociedades contemporâneas.
Talvez por essa dificuldade em regular os principios, no momento actual, onde já se vislumbram sinais muito perigosos de uma recessão mundial idêntica aquela que assolou a Europa e os EUA em 1929, continuemos a pouco fazer para dela nos defendermos e começámos já a fazer a invocação da divina providência, para que nos defenda e proteja de um acontecimento tão grave.
Não se trata de criar alarmismo – inimigo da razoabilidade – mas de adquirir consciência plena da realidade objectiva e essa, seja qual for o ângilo de análise, diz-nos que não vem aí nada de bom.
Dom Garrigues, falou também dos modelos de desenvolvimento económico – nomeadamente do espanhol – centrados na construção civil e no crédito aos promotores imobiliários. Modelo esse que está na génese da chamada crise do subprime nos EUA mas que avassala espanha de uma forma arrepiante, com centenas de promotores imobiliários insolventes, milhares de empresas de comercialização imobiliária falidas e os bancos a verem o volume de incumprimento de crédito a subir piramidalmente todos os dias.
A banca espanhola está seca. Não existe liquidez. E nem a injecção de cerca de 10 biliões de euros por parte do governo – na semana de tomada de posse de Zapatero – vai resolver o problema. É mais uma medida de controlo da crise do que uma medida que contribua para a resolução da mesma. É, no fundo, controlo de danos.
E como estamos nós por cá? Imunes ao que se passa em Espanha? Ou os efeitos da integração económica ibérica estão por aí camuflados? Ou ainda não começámos a sofrer todas as consequências?
Já estão a regressar de Espanha milhares e milhares de trabalhadores portugueses que estavam aí empregados na construção civil. Vêm engrossar as fileiras do desemprego e, por cá, vão encontrar um dia destes um cenário não muito diferente daquele que deixaram para trás.
Dom Garrigues teve o condão de, através de uma análise lúcida e bem informada, despertar em mim uma consciência mais clara do que aí está e do para aí vem.
No primeiro caso, a propósito da ética.
No segundo devido à sua ausência.
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