Texto da minha próxima crónica na revista HUMAN:
““As perspectivas para a economia portuguesa no período 2009-2010 são marcadas por um quadro de interacção entre uma crise sem precedentes nos mercados financeiros internacionais e um forte abrandamento da actividade económica à escala global, sendo expectável a ocorrência de um cenário recessivo na generalidade das economias avançadas e um baixo crescimento nas economias de mercado emergentes. Assim, as actuais projecções para a economia portuguesa apontam para uma contracção da actividade económica em 2009, seguida de uma recuperação moderada em 2010, num contexto em que a persistência de um conjunto de fragilidades de natureza estrutural continuará a condicionar o desempenho da economia.
A actividade económica em algumas das principais economias avançadas evidenciava já uma tendência de desaceleração desde o final de 2006 decorrente, em certa medida, do aumento do preço das matérias-primas nos mercados internacionais e do ajustamento em baixa dos preços nos mercados de habitação em vários países. A crise financeira que eclodiu em meados de 2007 acelerou esta tendência, nomeadamente pelo impacto negativo nas expectativas dos agentes económicos e na sua situação financeira, e deverá contribuir quer para uma recessão nas principais economias avançadas quer para uma significativa desaceleração da actividade nas economias de mercado emergentes e em desenvolvimento, as quais vinham registando ritmos de crescimento superiores aos tendenciais.
Uma pequena economia aberta plenamente integrada em ter mos económicos e financeiros como a economia portuguesa tende a ser afectada por estes desenvolvimentos, em particular atendendo ao seu elevado nível de endividamento.”
(Fonte: Banco de Portugal, Textos de Política e Situação Económica, Inverno de 2008, Boletim Económico | Inverno 2008 Volume 14, Número 4)
(sublinhados do autor)
Os portugueses estão divididos!
Entre o conceito popular de recessão – “a minha vida está a andar para trás” – e as previsões de contracção (sinónimo de muitas dores) do Banco de Portugal, passando pelos discursos pouco acertados do Sr. Primeiro-ministro e do Sr. Ministro da Finanças – que falam de “recessão técnica” (ou seja, uma economia que durante dois trimestres consecutivos “cresce negativamente” (como se crescer sinónimo de minguar), os portugueses continuam sem saber, exactamente, como classificar a actual situação económico-financeira. E contavam com o governo para os ajudar a perceber.
Vejamos:
a) A OCDE não tem dúvidas, chama-lhe recessão;
b) O Banco de Portugal tem dúvidas, chama-lhe contracção num quadro generalizado de abrandamento da actividade económica;
c) O governo não acredita em previsões – segundo o próprio Ministro das Finanças nem nas efectuadas pelo seu Gabinete – e, portanto, para não ser acusado de parcialidade, não aceita as previsões da OCDE nem segue a terminologia do Banco de Portugal. E porque contávamos com o governo para nos esclarecer – os governos também servem para esclarecer os cidadãos – os portugueses estão divididos.
Devemos acreditar em quê? Na progressiva diminuição da nossa conta bancária? No desemprego que começa a tornar-se um verdadeiro flagelo afectando milhares e milhares de famílias? No encerramento das empresas? No Banco de Portugal? Na OCDE? Nos “Gato Fedorento”? No Marcelo rebelo de Sousa? Na Manuela Ferreira Leite?
A citação inicial deste escrito, que constitui a introdução ao texto referido do Banco de Portugal, pela adjectivação que utiliza – pretensamente “não-comprometida” com nada, também nada ajuda ao nosso esclarecimento e ao esbater da divisão que neste momento existe entre os portugueses.
Estamos divididos entre dois grandes blocos.
De um lado os que não têm quaisquer dúvidas que estamos, efectivamente, em recessão económica e em crise financeira. Este bloco é constituído por todos aqueles que sentem a sua conta bancária a emagrecer, que já perderam o emprego, que não conseguem um empréstimo bancário e que não têm possibilidade de honrar os seus compromissos nem pagar as suas contas. Estes não têm dúvidas: o país está em recessão!
Do outro lado estão aqueles que, embora vejam os seus rendimentos a diminuir, ainda têm emprego e conseguem pagar, com algum esforço, as contas da electricidade, do gás, da prestação da casa e do carro. Estes concordam com o Banco de Portugal e acham que o País não está em recessão mas sim num processo de abrandamento económico (esquecem-se que o abrandamento, normalmente, acontece antes de pararmos).
Quer isto dizer que, ao fim e ao cabo, não devemos ficar surpreendidos pelo facto de o governo não nos esclarecer.
O governo, afinal, como representa todos os portugueses, assume a divisão em que estes se encontram: nem estamos em recessão, mas estamos em recessão, mas nós não estamos em recessão por nossa causa mas devido ao abrandamento da actividade económica dos outros países. Porque, afinal, nós por cá todos bem!
Ai recessão, recessão!!!
Sem comentários:
Enviar um comentário